segunda-feira, 12 de maio de 2008

Funcionamento básico do ventilador mecânico microprocessado


Todos os modos ventilatórios surgem da combinação das variáveis ventilatórias:
volume, pressão e fluxo em função do tempo. Os modos ventilatórios existentes, de acordo com a sua configuração, podem ter uma variável ventilatória livre (ex.: modo mandatório VCV), duas variáveis ventilatórias livres (ex.: modo mandatório PCV), três variáveis ventilatórias livres (ex.: o modo espontâneo PSV) ou até todas as quartro variáveis ventilatórias livres (ex.: modo espontâneo PAV) durante a fase inspiratória.

A figura abaixo mostra de forma simplificada o funcionamento de um respirador microprocessado. Após a programação do modo e dos parâmetros ventilatórios no painel de controle, o fluxo inspiratório é liberado através da válvula inspiratória para o paciente pelo ramo inspiratório do circuito do ventilador.

Na peça "Y" do circuito do respirador existe um sensor de pressão e um pneumotacógrafo (alguns respiradores têm dois pneumotacógrafos um no ramo expiratório após a válvula de exalação e outro internamente junto a válvula inspiratória), estes sensores transferem os dados de pressão e de fluxo respectivamente para um transdutor (inspiração e expiração) que alimenta a unidade central de processamento de dados - CPU.

Isto permite ao respirador:

1- Regular as válvulas inspiratória e expiratória para controlar o modo ventilatório que foi escolhido.

2- Fornecer uma leitura numérica e gráfica sobre o modo ventilatório e sobre a mecânica do SR do paciente.


3- Acionar os alarmes de segurança.


4- Ajustar as variáveis ventilatórias dos modos ventilatórios de duplo comando quando disponíveis ( ex.: PRVC, PAV e outros).


Dados sobre o trabalho respiratório do paciente também podem ser vistos em alguns respiradores, isto facilita o reajuste dos parâmetros ventilatórios ou a modificação do modo, quando necessário.

Os modos ventilatórios supracitados e alguns outros de uso freqüente no CTI serão abordados futuramente.

ATELECTASIA (tipos e causas)


Este organograma mostra os tipos de atelectasias e suas causas (para melhorar a visualização clique na imagem). Este tipo de complicação pulmonar é freqüente nos pacientes hospitalizados (tanto os adultos quanto os pediátricos) e na maioria das vezes requer intervenção imediata em virtude da grave repercussão que provoca na troca gasosa e na mecânica do SR, o que pode resultar em parada cardiorespiratória e óbito. Diante deste quadro a fisioterapia é imediatamente solicitada para solucionar o problema. A conduta fisioterapêutica comum é posicionar o paciente de forma a melhorar a mecânica respiratória e a ventilação alveolar, quando há colaboração do paciente sem uma via aérea artificial solicitamos que ele realize inspirações profundas ou inspirometria de incentivo e por fim, quando ainda não conseguimos reverter a atelectasia, instituimos pressão positiva nas vias aéreas com BiPAP ou CPAP que pode ser invasiva quando existe uma via aéra artificial - traqueostomia ou VNI - máscaras.

Como podemos ver no organograma existem causas de atelectasias que podem ser facilmente revertidas: todas as iatrogênicas, quase todas as obstrutivas intrínsecas (secreção, edema, broncoespasmo e broncomalácia), quase todas causadas por hipoventilação (todas por dor - o pacente deve também receber analgesia, todas por alteração da biomecânica e quase todas por fraqueza muscular - desnutrição, desuso e drogas). Algumas destas apesar de serem fáceis de reverter, têm uma maior probabilidade de retornarem: as causadas por broncoespasmo, broncomalácia e alteração da biomecânica. As demais podem retornar, mas dependem de estarem associadas a outros fatores.

Outras causas de atelectasia podem levar um tempo maior para serem revertidas, mesmo com a aplicação da pressão positiva e podem ter uma alta probabilidade de retornarem: todas por complacência ruim e as por fraqueza muscular (traumatismo raquimedular - TRM cervical alto e doenças neuromusculares - DNM).

Por fim, teríamos aquelas que não seriam revertidas ou só seriam durante o momento da aplicação da pressão positiva, pois retornariam após sua retirada: as obstrutivas intrínsecas e extrínsecas (tumor e abscessos), derrame pleural e tumor parenquimatoso, devido o fator compressivo não poder ser eliminado com as condutas fisioterapêuticas ou pressão positiva.

O corpos estranhos aspirados nem sempre são removidos com a aplicação de pressão positiva e manobras fisioterapêuticas, porém, quando são, a atelectasia é totalmente resolvida.

As atelectasias causadas por pneumotórax pioram com a aplicação da pressão positiva quando o tórax ainda não foi drenado e tornam o pneumotórax hipertensivo com grave repercussão na hemodinâmica.

Esta exposição mostrou quais os tipos de atelectasias que podemos nos deparar dentro de um hospital. Ficamos sabendo quais os casos que teremos maior chance de resolver com sucesso e quais os que nos exigirão maior desprendimento. Também soubemos sobre os casos em que devemos ter um maior cuidado quanto a possibilidade de retornarem e aqueles que não poderemos resolver.

Não devemos nos esquecer que existem casos mais complicados de serem resolvidos por mais que pareçam simples e que também podem existir complicações associadas, por ex. instabilidade hemodinâmica e atelectasia, pneumotórax e atelectasia. Não é incomum um diagnóstico
incorreto de atelectasia feito somente pela radiografia de tórax no leito, por isso devemos investigar todos os sinais que mostram a presença de uma atelectasia (ex.: imagem, mecânica respiratória, troca gasosa, expansibilidade torácica e ausculta pulmonar). Todas estas informações servem para nos mostrar se estamos obtendo êxito durante a nossa conduta terapêutica.

Todas as informações obtidas devem ser discutidas com o médico para que seja tomada a decisão mais correta para a solução do problema do nosso paciente.

sábado, 10 de maio de 2008

CPAP e trabalho respiratório na DPOC

Na DPOC agudizada, além da piora da troca gasosa (hipoxemia e acidose respiratória) que levam ao aumento da demanda ventilatória, o trabalho mecânico respiratório também se encontra bastante aumentado, tanto em virtude do aumento da resistência das vias aéreas (boncoespasmo e produção de secreções), quanto pelo aumento da carga elástica em virtude da auto-PEEP.

Alguns trabalhos científicos com bons níveis de evidência que avaliaram a VNI na DPOC agudizada mostraram que é bastante relevante o uso da VNI-BiPAP na diminuição da taxa de intubação, complicações respiratórias e mortalidade nestes pacientes.

Porém em muitos hospitais privados e públicos nem sempre dispomos destes equipamentos por serem muito caros. Nestas situações o uso do CPAP pode ajudar na melhoria da troca gasosa e na diminuição do trabalho respiratório. Para tentar explicar o efeito do CPAP na diminuição do trabalho respiratório da DPOC agudizada, mostrarei dois gráficos de relação volume-pressão em duas situações: DPOC sem CPAP e com CPAP.

O primeiro gráfico abaixo mostra a relação volume-pressão de um paciente com DPOC sem CPAP. A linha laranja é a curva volume-pressão durante a inspiração e expiração (setas brancas), a área vermelha é a auto-PEEP e a área amarela representa o trabalho respiratório realizado. Note que a inspiração começa a partir de um ponto onde a CRF está aumentada (esfera verde) e há um certo grau de estiramento pulmonar causado pela auto-PEEP. Para facilitar o entendimento vou considerar valores, supomos que a auto-PEEP seja de 10 cm H2O, o trabalho dos músculos inspiratórios se inicia a partir deste valor (10 cm H2O) e a contração destes músculos num primeiro momento é só para desfazer a auto-PEEP e quando as pressões alveolar e atmosférica se igualam ocorre a entrada de ar atmosférico pelas vias aéreas. Então podemos concluir que no primeiro momento da inspiração nenhuma ventilação está acontecendo, o trabalho ventilatório é ineficaz e só posteriormente é que há entrada de ar. Desta forma, o momento inspiratório na curva volume-pressão passa a ocorrer quando ela se encontra na fase pior (curva tendendo a se inclinar para o eixo da pressão) e uma maior força muscular será necessária para gerar o volume.



O segundo gráfico mostra uma situação onde um paciente com DPOC está sendo ventilado em CPAP. Como já comentado, utilizarei o valor de 10 cm H2O para a auto-PEEP e aplicarei um CPAP de igual valor. Nesta condição, pode-se ver que o trabalho respiratório (áreas amarelas) passa a acontecer acima da CRF (esfera verde) e abaixo dela. Acima dela, a inspiração acontece normalmente pela atividade muscular inspiratória normal (inspiração ativa), a expiração que se dá a seguir também acontece normalmente (expiração passiva) até a CRF. Abaixo deste nível volumétrico (área amarela abaixo da esfera verde - CRF), a atividade muscular expiratória se encarrega de aumentar a exalação (ativa). A interrupção da atividade muscular expiratória subseqüente, acarreta no reestabelecimento da CRF (esfera verde) por meio do aumento do volume promovido pelo CPAP após o relaxamento dos músculos expiratórios (inspiração passiva).


A conclusão desta exposição mostra que é válido utilizar o CPAP quando não dispomos de equipamentos mais sofisticados como o BiPAP para fazer VNI nos pacientes com DPOC. Alguns tipos de CPAPs também são caros, mas são muito mais acessíveis do que o BiPAP.

Nas próximas postagens mostrarei como se confeccina passo a passo, um gerador de fluxo de CPAP com um baixo custo e que tem a mesma eficácia dos industrializados.

terça-feira, 6 de maio de 2008

Complacência do SR x Efeitos hemodinâmicos da pressão positiva

Os efeitos hemodinâmicos relacionados com a pressão positiva intratorácica são bem compreendidos e foram citados em postagens anteriores neste blog (vejam se necessário). Agora, pretendo falar sobre o impacto da mecânica (complacência) do sistema respiratório na hemodinâmica durante a VM com pressão positiva.

Para tal, trago algumas figuras bastante simplificadas que mostram bem as estruturas relacionadas com o que será dito.

Esta primeira figura, mostra uma condição de normalidade da mecânica respiratória. As estruturas desenhadas são: a parede torácica (em preto), as vias aéreas e pulmões (em azul), o coração e os grandes vasos (em vermelho). Uma seta verde mostra o ar entrando durante a VM. As setas pequenas mostram o sentido de deslocamento das estruturas citadas durante a inspiração. Note que, durante a insuflação pulmonar os pulmões se expandem em todos os sentidos, mas como a parede torácica se expande junto, ocorre pouco efeito compressivo da expansão dos pulmões sobre o coração e os grandes vasos.


Nesta outra figura, temos uma situação em que a parede torácica está com a complacência muito diminuída (linha preta espessa) e a complacência dos pulmões está normal. Ex. Obesidade mórbida e ascite. Durante a insuflação em VM, podemos ver que os pulmões tentam se expandir em todos os sentidos, porém a parede torácica pouco ou nada se movimenta para fora, gerando um encarceramento dos pulmões. Desta forma a expansão pulmonar se dirige para dentro em maior grau e isto resulta em maior compressão das estruturas intratorácicas. Desta forma, o coração e os grandes vasos recebem pouco sangue da circulação venosa (retorno venoso prejudicado). Mesmo com pressões inspiratórias não muito altas este efeito compressivo cardiovascular pode acontecer resultando em hipotensão arterial.


Esta última figura, representa uma situação onde os pulmões é que estão pouco complacentes (linha azul espessa). Ex. Fibrose pulmonar. Note que durante a insuflação mecânica, os pulmões se expandem pouco e quase não exercem deslocamento tanto na parede torácica para fora, quanto nas estruturas intratorácicas para dentro. Mesmo que se utilizem altas pressões inspiratórias, nesta condição pouco há risco de compressão cardiovascular e hipotensão.


Não podemos nos esquecer que estes desenhos são simplificações de doenças ou de comprometimentos pulmonares. Eles são válidos para o entendimento sobre as implicações hemodinâmicas durante a VM e as condutas fisioterapêuticas voltadas à expansão pulmonar com pressão positiva que utilizamos em Terapia Intensiva. Em condições reais nem sempre encontraremos as mesmas manifestações fisiopatológicas exemplificadas acima ou até podemos encontrar uma combinação delas. Por isso devemos sempre acompanhar de perto tudo aquilo que está sendo feito com o paciente. A monitorização do estado geral do paciente e das funções vitais não devem ser negligenciadas em função das informações específicas relacionadas àquilo que estamos fazendo.

Todo conhecimento é importante quando aliado ao bom senso.

domingo, 4 de maio de 2008

Equação de movimento do SR

É comum a utilização de modelos para representar o comportamento mecânico da respiração e de como os ventiladores trabalham.
Este modelo bastante simples, nos mostra as relações entre as variáveis mecânicas (pressão, fluxo e volume) relacionadas com a mecânica da respiração. A equação descrita nos mostra a pressão necessária para promover a entrada de ar nas vias aéreas e nos pulmões. A figura utiliza um conduto de fluxo rígido acoplado a um compartimento elástico, desta forma é possível ver as relações entre as variáveis de forma simplificada.

Nós nos referimos a este modelo como equação de movimento do sistema respiratório.

pressão muscular + pressão ventilador = (volume x elastância) + (fluxo x resistência)

Para facilitar o cálculo à beira do leito durante a ventilação mecânica, o termo elastância é substituído por complacência. Ficando então:

pressão muscular + pressão ventilador = (volume / complacência) + (fluxo x resistência)

A complacência é o inverso da elastância, desta forma dividimos o volume pela complacência.

O volume, fluxo e pressão são variáveis relacionadas ao tempo.

No final da expiração, em condições normais, na auxência do ventilador, estes valores são: pressão muscular = zero, pressão ventilador = zero (inexistente), volume = capacidade residual funcional e fluxo = zero. Durante a Ventilação Mecânica estes valores podem se modificar: pressão muscular = zero, pressão ventilador = PEEP, volume = volume pulmonar expiratório final e fluxo = zero.

Durante a inspiração em ventilação mecânica, um fluxo de gás é dirigido às vias aéreas e o volume pumonar aumenta concomitante com a pressão. Esta pressão é chamada de transrespiratória - pressão de abertura das vias aéreas, boca ou via aérea artificial, subtraída da pressão de superfície corporal. Podemos considerar a pressão de superfície corporal igual a ZERO, desta forma a pressão transrespiratória é igual a pressão de pico do respirador (Ppico). Ela tem dois componentes: pressão transaérea - pressão da abertura das vias aéreas, boca ou via aérea artificial, (= Ppico) subtraída da pressão pulmonar (= Pplatô) e pressão transtorácica - pressão pulmonar (= Pplatô) subtraída da pressão de superfície corporal (ZERO).

A pressão pulmonar é encontrada quando fazemos uma pausa no final da inspiração (volume inspirado aprisionado e fluxo = zero) também chamada de pressão de platô ou pausa (Pplatô).

Nós ocasionalmente usamos o termo pressão transpulmonar - pressão pulmonar (= Pplatô) subtraída da pressão pleural (Ppl), para isto necessitamos da medida da pressão pleural que pode ser estimada pela pressão esofagiana (Pes).

Elastância (= variação de pressão / variação de volume) junto com a resistência (= variação de pressão / variação de fluxo) formam a carga contra a qual os músculos respiratórios e o ventilador tem que trabalhar.

pressão muscular + pressão ventilador = carga elástica + carga resistiva

A carga elástica é a pressão necessária para fornecer o volume (elastância x volume) e a carga resistiva é a pressão necessária para liberar o fluxo (resistência x fluxo). Como já foi dito é comum utilizarmos a complacência ao invés da elastância. Complacência = 1 / elastância.

Em condições normais, a pressão dos músculos respiratórios são capazes de realizar todo o trabalho da respiração e a ventilação não necessita de assistência mecânica.
Quando um paciente está conectado ao respirador, a pressão dirigida à ventilação pode ser toda do aparelho (pressão muscular = zero) - suporte ventilatório total, ou do respirador e do paciente (pressão muscular parcial + pressão do respirador parcial) - suporte ventilatório parcial.

Extraído do livro: Fundamentals of Mechanical Ventilation. Robert L. Chatburn. 2003.